Dia 4 - O silêncio de gente
Ainda não "desconfinei". A vida esta semana é exactamente igual à das últimas semanas. Sair apenas para o que é fundamental e para os "Passeios higiénicos".
Aqui entre nós haverá coisa mais parva que chamar ao "passeio para não dar em louca, apanhar sol nas trombas e esticar as pernas" de "passeio higiénico"? Eu nunca consigo pronunciar o tal "higiénico" sem um levantar de sobrolho e um tom ligeiramente irónico.
De qualquer modo, com o sol que resolveu regressar, regressou também uma vontade de ir dar uma volta. O melhor de daqueles vinte minutos é o silêncio. Saímos, eu e a minha mãe, mantemo-nos perto de casa, raramente encontramos alguém e, em determinada rua, somos cumprimentadas por todos os cães que ali vivem. E quando digo "cumprimentadas" quero dizer que eles ladram e eu digo "olá" de volta. Sem ladrar, escusam de estar aí já a fazer piadinhas. Há dias em que tagarelamos o tempo todo e há dias em que caminhamos naquele silêncio cúmplice. E vemos cada flor. As papoilas à beira da estrada, os malmequeres que teimam em crescer, o rosmaninho, as rosas, as buganvílias que enfeitam os muros e um jardim cheio de gardénias em flor. Ouvimos o som dos pássaros, dos insectos, da natureza a ganhar vida. E as nespereiras que estão carregadas e que são uma tentação.
A vida terá que regressar mas vou ter saudades deste silêncio de gente.