A minha tribo
Sempre vivi entre o campo e cidade, saltitando com facilidade entre um e outro grupo. Na verdade esta facilidade era, por vezes, esforçada, fabricada, pouco natural. Sempre me senti parte da tribo mas não completamente. Percebem o que quero dizer?
Na aldeia era meio estranha, ouvia música um bocadinho diferente, achava que tinha direito ao mesmo que os rapazes (e felizmente a minha mãe também), gostava de andar de skate e patins, lia livros e jogava às cartas e ao berlinde. Na cidade era meio estranha, vivia longe da família, tinha liberdade e nunca estava disponível nas férias e nos fins de semana – ia para a aldeia. E claro, ouvia música um bocadinho diferente, achava que tinha direito ao mesmo que os rapazes, conhecia todos os cães da vizinhança (apesar de não conhecer os vizinhos) e lia livros.
Na aldeia não tinha biblioteca, exceto a da minha casa, na cidade, era das poucas que frequentava a biblioteca, onde rapidamente deixaram de me tentar orientar nas leituras (tentavam, de início, que as crianças lessem o que era adequado à sua idade – comigo isso durou cerca de 2 semanas).
Ainda hoje me sinto assim, estranha mesmo onde pertenço e precisei de chegar à idade adulta para encontrar a minha tribo, cheia de pessoas diferentes, vindas de todo o mundo, que falam a mesma língua que eu. Pessoas com quem consigo ser eu, esta mistura de serra, mar e cidade e continuar a ser meio estranha e isso, finalmente, não ser nada estranho.